quarta-feira, 29 de abril de 2009

Song to Bob

Hey, hey Bob, eu lhe escrevo esta crônica, sobre um mundo cômico, doente, faminto e cansativo. Mundo moribundo, onde nascer é um fardo pesado.


Ouço muitas pessoas falando, mas ninguém ouvindo. Ouço o lamento de uma pessoa faminta e ouço a risada de muitas outras. Ouço as palavras do poeta que jaz morto na sarjeta. Heard the sound of a clown who cried in the alley.


I dreamed a dream que me deixou muito triste, era a respeito dos poucos amigos que tive. Lembrei-me das muitas tardes que passamos juntos e dos risos e cantorias até o amanhecer. Nunca pensamos que poderíamos envelhecer tanto, esperávamos que pudéssemos nos divertir para sempre, mas as chances para isso acontecer era uma em um milhão. Desejei muitas vezes em vão que voltássemos a sentar-nos juntos novamente. Pagaria a quantia que fosse, e faria isso alegremente, se nossas vidas pudessem voltar a ser como era.


Agora são meia noite e dez, acordarei às seis, mas não estou com sono e não tenho lugar para ir, então toque uma música para mim senhor Homem-Tamborim.


Me perguntam por que bebo o tempo todo: isso acalma minha mente, canto e imagino dias melhores. Assim não preciso de um carro esportivo, posso caminhar a qualquer hora pela vizinhança. Infelizmente, hoje em dia você sai por ai, dá ‘oi’ para um estranho e ele se afasta com medo, achando que é um assalto ou um comunista. Mas, de fato, se eles pudessem ler meus pensamentos, eu seria condenado à guilhotina. But it's alright, Ma, it's life, and life only.


Mas não sejamos tão melancólicos, por favor, Let me forget about today until tomorrow. Bob, se os Beatles aprenderam muito com você, deverias também ouvir um pouco dos que os meninos têm a dizer. There's nothing you can do that can't be done, nothing you can sing that can't be sung… Você acredita em amor a primeira vista? Estou certo que acontece o tempo todo.


Bob, deixe-me lhe contar, conhecia uma garota, mas ela tem tudo que precisa, é uma artista e nem olha para trás. Eu disse a ela: honey, just allow me one more chance to get along with you, de fazer qualquer coisa boba, num lugar bobo. Mas Bob, I ain' a-got Corrina, life don't mean a thing.


Certa vez lhe pedi um beijo, mas a resposta, meu amigo Bob, is blowing in the wind...

quarta-feira, 1 de abril de 2009

A eternidade e o instante

Certa vez, um amigo físico sugeriu-me pegar o átomo de césio 133 e olhar atentamente para um de seus níveis energéticos hiperfinos - tinha que ser em estado fundamental. Então, eu deveria esperar que houvesse uma mudança de nível com emissão de radiação. Isso ocorreria entre um tique e um taque, ele me avisou. Mas não seria como um hífen e sim como 9 bilhões de períodos de onda radioativa.

Em outras palavras, ele queria me mostrar que um segundo é muita coisa.

Mas nem sempre o instante foi um tempo com tanto significado. Durante várias centenas de anos, desde que o homem raciocinou a passagem do tempo através da linguagem, a morte era o que dava significado à vida. O devir era um projeto a longuíssimo prazo, pois tudo o que fosse feito teria que ser feito enquanto o sangue pulsasse nas veias. Os atos possuíam conseqüências e o julgamento era certo: para sempre no inferno, no limbo ou no paraíso. Depois desse curto período que é a vida, nada mais poderia ser mudado. Assim, Deus e eternidade se confundiam, dando ao cotidiano trabalho para o além.

A morte, longe de ser um ponto em algum lugar divinamente escolhido na linha temporal da vida das almas, tornou-se, no século XVIII, uma questão de probabilidade. Dependendo de suas condições materiais e psicológicas, uma pessoa teria tantos porcento de chance de viver tantos anos, com incerteza de mais ou menos alguns meses. Somado a isso, a eternidade, uma categoria infinita, tão certa quanto indecifrável, perdeu lugar para o absoluto, um conceito fechado pelas inumeráveis brechas criadas pela ciência.

A rapidez com que os eventos podem ocorrer hoje tanto jogou o Criador para escanteio como evidenciou ainda mais a falta de significado da existência. O que dá na mesma. Porém, buscar nomes para as coisas é o que torna o homem um ente privilegiado. E continuamos fazendo isso, com ou sem um futuro no horizonte.

Foi desse comportamento essencial de perguntar-se sobre si mesmo e sobre as coisas que a filosofia moderna encontrou novamente a unidade: ser é tempo. E cada época nos dá modalidades de ser para representarmos durante nossa vida.

Só para citar um exemplo, na literatura as formas breves foram ganhando espaço à medida que todas as outras atividades do cotidiano aumentaram de velocidade. Ninguém mais ousaria escrever um poema homérico como Os Lusíadas; já se sabe de antemão que não haverá leitor.

Novelas, contos, crônicas, folhetins, todos esses modos de ser da literatura moderna nasceram por uma exigência da época e vingaram pois a condição material já circulava pelas ruas, ou seja, as publicações periódicas. Os jornais e as revistas encaixaram-se perfeitamente na mentalidade do consumo descartável que estava nascendo.

É fácil perceber que, no experimentalismo do século XX, as artes chegariam a um de seus limites: o colapso ou a infinitude. Música e literatura atingiram o silêncio. As artes plásticas saíram dos seus limites convencionais e caminham pelo espaço. Não há mais escolas artísticas nem critérios para a estética.

A enorme variedade de informação disponível nos empurra para aleatórias combinações de elementos anacrônicos que, por mais que não tenhamos vivido-os, desde sempre nos pertencem, pois a cada momento trocamos os seus significados.

Talvez a mais importante dessas re-significações tenha sido o instante eterno.

primeiro de abril de 2009