domingo, 13 de fevereiro de 2011

Arte Urbana e a Dimensão do Tempo.



A passagem do tempo, a finitude da existência, é uma questão inexorável para os seres vivos, mas algo que sempre foi evitado e combatido dentre os elementos que constituem uma obra de arte. A arte tradicional é um documento histórico que transcende a sua geração e nos remete a outras épocas - como uma máquina do tempo - onde sua materialidade nos transporta a um contexto perdido no passado, ao cotidiano de uma sociedade que foi completada reconstruída e adulterada. Sentar-se à frente de um quadro de Van Gogh é experimentar estar sob a mesma perspectiva vivida pelo artista, é colocar-se em seu lugar e quase incorporar a atmosfera por ele experienciada. A obra de arte pode ser a perpetuação da existência do seu criador e de sua sociedade, sendo constantemente ressuscitados por aqueles que com ela estabelecem uma relação no presente.

No entanto, a arte efêmera, a arte das ruas, a arte urbana, incorpora como uma de suas características fundamentais a dimensão do tempo e a decrepitude de sua existência. Envelhece com a cidade, juntamente como seus cidadãos, fazendo parte de um período histórico singular, estabelecendo um diálogo com um instante específico. É uma arte que não se descola do seu contexto de origem; nasce e morre atrelada a sua cidade e geração. Assim como seu criador, deixará a vida para existir apenas em memória.

Entregue às intempéries do ambiente urbano, às intervenções do tempo e humanas, a arte urbana tem a necessidade da ação dos outros, necessita ser olhada e causar afetações nos seus expectadores. Ela está na rua porque seu anseio maior é ser vista e fazer parte do cotidiano da cidade, estabelecendo relações (não importa quais elas sejam) com os seus contemporâneos. Esta sua necessidade de vida é, paradoxalmente, a sua condenação a morte.

A arte urbana, assim como outras formas de arte contemporânea, está em consonância com as características do seu tempo, com a modernidade e sua perene reciclagem (criação e destruição), sempre dando lugar ao novo, tornando-se obsoleto a partir do seu surgimento. Ser urbano e ser moderno é estar em constante substituição, renovação; “o dinamismo inato da economia moderna e da cultura que nasce dessa economia aniquila tudo aquilo que cria – ambientes físicos, instituições sociais, idéias metafísicas, visões artísticas, valores morais – a fim de criar mais, de continuar infindavelmente criando o mundo de outras formas” (Marshal Berman, 1982).

Então, que arte nos representará num futuro distante e nos remeterá a eternidade? É possível que sejamos esquecidos dentro de pouco...




3 comentários:

Dak disse...

Eu havia lido este post no dia que vc postou, e fiquei pensando em o que deveria escrever para comentar, dias passavam e me pegava lembrando de comentar este post. Hoje passei por um desenho que havia feito há um tempo e naquele instante lembrei-me deste post, poxa (deixa eu comentar hoje para ter paz com minha consciência). Chequei a uma conclusão, este post está perfeito.
A idéia de emoldurá-las foi uma boa sacada.

Tiago A. disse...

Olá Gabriel. Passei por acaso e li seu texto. Gostei, mas preciso discordar da sua visão de "arte tradicional". Pensar nela como um documento histórico, atrelado necessariamente ao passado, é matá-la enquanto arte. Já leu "Pierre Menard, autor do Quixote"? Acho que o Borges apresenta uns bons argumentos nesse texto. Abraço.

GBA disse...

Oi Tiago, legal seu comentário. Concordo com vc, uma arte que sirva apenas como documento histórico - arte datada - perde todas as suas outras características. Mas no meu texto me foquei somente nesse aspecto para fazer uma comparação da arte dita "tradicional" com a arte efêmera (mais especificamente a arte urbana), quanto a suas relações com o tempo e existência.

Já li sim esse conto do Borges, mas não lembro muito dos detalhes. Vou relê-lo para saber sobre o que vc se refere.

Abraço